1NNEDY ALENCAR
Washington
O ministro da Defesa, Fernando Azevedo, mentiu ao divulgar nota dizendo que o golpe de 1964 “é um marco para a democracia brasileira”. A nota também foi assinada pelos comandantes das três forças.
É fake news dizer para as atuais gerações que um golpe que fechou o Congresso, cassou mandatos, matou gente e a democracia tenha sido um marco justamente na defesa da democracia. É uma tentativa canhestra de reescrever a História.
Trata-se de um crime contra a memória do Brasil e das vítimas da ditadura. Serve à divisão do país, deseduca o povo e infla conflitos.
Para piorar, o também general da reserva Eduardo Villas Bôas, ex-comandante do Exército, publicou em rede social mais uma manifestação golpista. Villas Bôas falou que “ações extremadas podem acarretar consequências imprevisíveis”, referindo-se ao desgoverno Bolsonaro e ao covid-19. “Pode-se discordar do presidente, mas a postura revela coragem e perseverança nas próprias convicções”, escreveu.
Apesar de não surpreender, a fala é abjeta. Não se trata de ter coragem tampouco de perseverar “nas próprias convicções”, mas de se comportar de forma irresponsável colocando em risco a saúde dos brasileiros. Bolsonaro tem causado dano à saúde pública.
Twitter, Facebook e Google apagaram posts do presidente da República, dada a sua falta de seriedade no que publica na internet. Quem merece reprimenda é Bolsonaro. Quem toma atitudes contra a saúde pública é Bolsonaro.
Com frequência, há relatos na imprensa brasileira sobre as alas ideológica e militar do governo, como se a segunda tivesse bom senso. Piada.
As manifestações do ministro da Defesa e do ex-comandante do Exército são puro terraplanismo político-militar. Esses generais são iguais a Bolsonaro e não ficam devendo nada para figuras da sombra como Olavo de Carvalho.
Nas redes sociais, o vice-presidente Hamilton Mourão também mentiu a respeito de 64. Que papelão. Embrulha o estômago ver isso em 2020.
Efeito corona
Na Hungria, o coronavírus serviu de pretexto para a aprovação de uma lei no Parlamento que é um golpe institucional, transformando o primeiro-ministro, Viktor Orban, num ditador.
A Hungria, que já era uma democracia frágil e acossada pelo autoritarismo de Orban, tem agora Parlamento fechado, eleições canceladas e primeiro-ministro que governa por decreto. É mais ou menos o que aconteceu no golpe de 64 no Brasil.
Há pressão ainda maior sobre o que restou de imprensa independente na Hungria. O coronavírus cai como uma luva para candidatos a ditador mundo afora, inclusive no Brasil. Na Europa, nasceu uma ditadura.
Tempos duros
Nos EUA, a certeza é que abril será pior do que março em número de casos e mortes por covid-19. Ontem, segunda-feira, foi o dia mais mortal, com mais de 500 mortes contabilizadas. Na manhã desta terça, os Estados Unidos contavam mais de 160 mil casos e mais de 3 mil mortes.
O presidente Donald Trump afirma que foram feitos um milhão de testes. Trump diz que é o país que mais testa. Em números absolutos, sim. Em números relativos, ainda está atrás da Coreia do Sul e da Itália em testes per capita.
Trump disse que as recomendações de isolamento social prorrogadas até o fim de abril podem salvar 1 milhão de vidas. É uma tentativa de tirar pressão dos hospitais, sobretudo no Estado de Nova York, que está perto do colapso no atendimento.
O presidente americano foi convencido pelos cientistas de que estava dando corda ao falso dilema de escolher entre a economia e a saúde pública. Sem salvar a saúde a pública, seria pior para a economia. Não haveria economia com uma tentativa de reativá-la antes da hora. O resultado poderia ser pior.
Trump fez uma correção de rumos no discurso e nas atitudes. Rendeu-se à realidade. Basta comparar com o que ele dizia até 15 dias, 10 dias atrás. Agora, a briga dele é com os governadores. Quer terceirizar responsabilidades, mas ouviu os cientistas, o que é bom, pois ajuda a parar de errar tanto como ele vinha errando ao subestimar o coronavírus.
Mais um aperto
No Distrito de Colúmbia, a prefeita de Washington, Muriel Bowser, decretou ontem ordem para os cidadãos ficarem em casa a partir da meia-noite de hoje. Ela segue orientações de maior restrição de isolamento social já decretadas em Maryland e Virginia, que fazem parte da Grande Washington, a região metropolitana.
Só será permitido sair para atividades essenciais, como comprar comida e remédio, e algumas exceções, exercícios físicos e levar o cachorro para passear. As regras valerão por um mês.