Elas se despediram do Japão com nove medalhas, sendo três ouros, quatro pratas e dois bronzes
por Cristiane Sampaio
A delegação brasileira se despediu do Japão neste domingo (8) com um recorde no desempenho feminino do país: foram, ao todo, nove medalhas conquistadas nos Jogos de Tóquio 2020, com três ouros, quatro pratas e dois bronzes.
Até então, a melhor marca havia sido registrada em Pequim, na China, no ano de 2008, quando as representantes do Brasil faturaram sete condecorações do tipo. No Rio de Janeiro (RJ), em 2016, por exemplo, elas subiram ao pódio cinco vezes.
O recorde da edição deste ano foi batido após a vitória da nadadora Ana Marcela Cunha, que ficou em primeiro lugar nos 10 km da maratona aquática. Ocorrida na última quarta (4), a conquista resultou na oitava medalha obtida pelas mulheres e veio banhada de muita emoção.
Ana Marcela participou da primeira Olimpíada com 16 anos e estava havia 13 tentando alcançar a tão sonhada medalha olímpica. “Nem nos meus melhores sonhos imaginei que a minha medalha iria ser a do recorde das mulheres”, vibrou a atleta, em entrevista publicada no portal Time Brasil.
E o que dizer, então, de Rebeca Andrade, a paulista de Guarulhos que levou a primeira medalha de ouro da história da ginástica feminina do Brasil nos Jogos Olímpicos e também faturou a prata no individual geral, em uma dobradinha que emocionou o país?
A comemoração que circundou o feito de Rebeca também deu o tom da despedida de outras competidoras brasileiras que bateram marcas no Japão. A maranhense Rayssa Leal, que conta apenas 13 anos, ficou em segundo lugar na categoria “street” do skate, ganhando o título de mais jovem medalhista brasileira da história.
Paralelamente, a judoca Mayra Aguiar se tornou a primeira mulher brasileira a faturar três medalhas olímpicas em um esporte de caráter individual. O Brasil também viveu um capítulo inédito no tênis, com a chegada da primeira medalha olímpica da dupla Luisa Stefani e Laura Pigossi, que saiu do Japão levando o bronze.
Além disso, faturaram ouro no evento as bicampeãs olímpicas na vela Martine Grael e Kahena Kunze, que fizeram a família Grael chegar a nove medalhas olímpicas. Com isso, o núcleo ingressou no seleto grupo dos dez clãs com mais medalhas obtidas no evento.
Outro resultado histórico foi garantido pela baiana Beatriz Ferreira, que se tornou a primeira finalista brasileira no esporte e voltou para casa com a prata. Também conquistou o segundo lugar no pódio a equipe do vôlei feminino, que fechou as conquistas das brasileiras no domingo (8), em uma disputa com o time dos Estados Unidos.
■ História
O resultado das mulheres é apontado como um dos fatores principais do melhor desempenho geral do Brasil nesta última edição das Olimpíadas, da qual o país saiu com um total de 21 medalhas, contra 19 obtidas na edição Rio-2016.
“Essa marca mostra que as mulheres são muito capazes, que elas estão fazendo um trabalho árduo, mas que precisam de investimentos, de incentivos, pra que outras grandes marcas sejam batidas na próxima Olimpíada, nas próximas edições”, diz Jane Moura, co-fundadora da ONG Empodera, que incentiva mulheres a se engajarem, atuarem e se manterem no esporte.
Ela lembra que, além de terem, em geral, menor visibilidade midiática do que os homens em diversas modalidades, as mulheres enfrentam um quadro permanente de falta de patrocínio e incentivos à prática de esporte no segmento. Por conta disso, Jane Moura aponta que o placar final delas diante desses resultados faz com que a jornada de Tóquio seja ainda mais especial, pois pode ajudar a sedimentar caminhos mais favoráveis às atletas.
“É muito representativo e acho que abre portas também pra que as instituições esportivas, a grande mídia e outras instituições que regulam o esporte, como o próprio governo federal, possam olhar com mais cuidado, o cuidado que deveriam ter há muitos anos com o esporte de mulheres”, completa.
Racismo e pobreza
Se em geral as atletas brasileiras já enfrentam um contexto de alta desigualdade de gênero, sendo constantemente desprivilegiadas em relação aos homens no esporte, as assimetrias de classe e de raça tornam o ambiente ainda mais cruel para aquelas que são pobres, negras e periféricas.
O assunto foi lembrado, por exemplo, pela ex-ginasta Daiane dos Santos, que se emocionou diante das telas ao comemorar, no último dia 29, a conquista do segundo lugar no pódio por Rebeca Andrade na ginástica artística. Daiane foi a primeira brasileira, entre homens e mulheres, a faturar a medalha de ouro no Campeonato Mundial de Ginástica Artística, em 2003. A gaúcha destacou, do alto de sua experiência no esporte, o peso da conquista de Rebeca.
“Agora a gente tem a primeira medalha do Brasil na ginástica artística com uma negra. Isso é muito forte. Até pouco tempo os negros não podiam competir em alguns esportes. É uma menina que veio de origem humilde, criada por uma mãe solo, veio de várias lesões para ser e a segunda melhor atleta do mundo”, disse, efusivamente, durante transmissão da TV Globo, onde atuou como comentarista nos jogos.
Amplamente comemorado, o resultado de Rebeca foi precedido por uma performance que fez o público vibrar ao som de uma adaptação do funk “Baile de Favela”, ritmo que evoca a música e a cultura das periferias.
A conquista da ginasta e o resultado geral das mulheres são o principal motor que ajuda a alimentar a empolgação de jovens como a carioca Hingride Marcelle Leite de Jesus, de 21 anos, jogadora de rugby que é negra, periférica e agora mira o futuro com um sorriso mais largo ao olhar para a conquista das brasileiras em Tóquio. Ela diz que se sente ainda mais inspirada diante do saldo.
“É, de fato, o reconhecimento de nós mulheres, da nossa presença nos esportes. É mais um resultado de todo um esforço, de toda a trajetória, de toda a luta das nossas antecedentes que lutaram pra conquistar esses espaços.”
Confira a lista completa das medalhas que as brasileiras trouxeram pra casa:
– Ouro: Rebeca Andrade (ginástica artística/salto)
– Ouro: Martine Grael/Kahena Kunze (vela/prova 49er FX)
– Ouro: Marcela Cunha (natação/maratona aquática)
– Prata: Rayssa Leal (skate/street)
– Prata: Rebeca Andrade (ginástica artistic/ individual geral)
– Prata: Beatriz Ferreira (boxe/peso leve)
– Prata: equipe feminina (vôlei)
– Bronze: Mayra Aguiar (judô/-78kg)
– Bronze: Laura Pigossi/ Luisa Stefani (tênis duplas)
fonte::Brasil de Fato